Arrumar a bola à frente e mirá-la no ponto desejado, seja sobre ou dentro da rede, exige concentração e talento. O mesmo acontece com cada um de nós, seja neste, ou naquele momento, no canto que for. A gente se depara com o quadro do corredor desalinhado. Ajeita, e ainda descobre a poeira na lateral esquerda. Mais à frente, descobre a luz do banheiro que ficou acesa e a torneira da pia que ficou pingando. Acorda o filho jogado na cama e faz com que levante para os acertos de agora que refletirão no seu futuro. Mas aquela pele do canto direito no indicador esquerdo continua a incomodar. Busca o alicate no banheiro e ele está cego e só faz doer o que apenas incomodava. De repente, nos deparamos frente ao espelho e visualizamos a figura espantosa e perdida, sem saber se penteia os cabelos, ou escova os dentes, ou passa um batom, ou joga uma água na cara.
Na realidade, essa é a minha figura.
E, num piscar de olhos, me envolvo em meus desalinhos, choro num desespero convulsivo perante o fato concreto de que não consegui arrumar com todo o meu carinho e dedicação aquele que amo com todas as minhas forças e ainda peço perdão à Deus. Corro ao telefone e peço que minha irmã me aconselhe. Recebo seu acalanto e, aos poucos, vou conseguindo voltar ao chão, de onde nunca deveria ter saído. Arrumo meus chinelos e calço nos meus pés, como se eles fossem me conduzir a um novo espaço e a um novo tempo. A realidade está aí: nem sempre podemos tudo.
Perante a nossa conquista está o que chamamos de limite. Aquilo que está bagunçado, desalinhado, torto aos meus olhos, não incomoda o outro. Seu mundo é outro e não permite os meus cuidados, a minha atenção, a minha dor. É melhor eu iniciar com uma água na cara, escovar meus dentes, pentear meus cabelos e passar meu batom. Agora é a vez de escolher os brincos, me saudar no espelho com um grande beijo e aceitar o outro no encontro que o Universo me permitiu, mas… com um espaço bem grande para eu poder existir e amar a Vida com toda a sua beleza.
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