Para Carl Gustav Jung, Pai e Mãe são dimensões arquetípicas da psique coletiva consteladas por meio de nossos pais e mães pessoais. Contudo, existem poucas referências de Carl Jung à figura paterna, por isso é difícil definir uma teoria “junguiana” para o tema.
Alguns pós-junguianos levaram adiante o tema e se aprofundaram nele, trazendo algumas contribuições. Para iniciar, então, é importante mostrar a diferença do pai em relação à mãe. A mãe está mais ligada à concretude (ela é o leite materno), já o pai é uma abstração (a palavra).
Para alguns pós-junguianos, o exercício da maternidade se volta para a expressão de uma singularidade. A mãe vê o individuo. Já a paternidade se volta prioritariamente para o sobrenome e não para o sujeito, como sinal de pertencer ao coletivo (privilegia a adaptação). A mãe particulariza e o pai, em sua manifestação arquetípica, uniformiza e normatiza.
O arquétipo Pai para a Psicologia Analítica seria o arquétipo base da fase patriarcal de desenvolvimento humano individual e coletivo e, com isso, muitos junguianos tendem a dividir o desenvolvimento psíquico humano em dinamismos básicos: o matriarcal e o patriarcal como estruturantes para a psique individual e coletiva; e a considerar o dinamismo patriarcal superior ao matriarcal.
No entanto, devemos lembrar que um dinamismo não é superior ao outro, e a fase anterior não é ultrapassada nem regressiva, pois elas se alternam na consciência ao longo da vida do ser humano, seja por influências externas e internas.
Hoje vivemos, enquanto sociedade, na fase patriarcal, que começa a apresentar problemas pela unilateralidade. Nunca se viu tantos indivíduos normatizados e individualidade, o ser deixado de lado.
Agora, após a distinção do Pai em relação à Mãe, podemos aprofundar em suas características.
O arquétipo Pai corresponde às palavras de ordem e orientação. Quando o filho começa a crescer e se tornar independente, começa a se contrapor a essas palavras com palavras inovadoras de si próprios, que são emanações espirituais da própria psique do filho, mas que foram suscitadas pela palavra paterna e independente dela.
Ao lado da palavra também existe a conduta: o pai é o exemplo! O que ele diz é de importância relativa comparada com as ações. Os filhos decodificam os gestos dos pais como recomendações e são bons aprendizes, fazendo generalizações.
Também representa o princípio organizador e governa a força e a violência.
Em termos coletivos, o patriarcado permitiu o desenvolvimento da ciência e tecnologia, mas por outro lado perdemos a realidade da alma.
O princípio paternal também domina os instintos e o desejo. Do lado positivo, auxilia no processo de humanização e a dificuldade de realização do desejo possibilita o desenvolvimento da personalidade. No entanto, essa ordem e dominação se forem excessivas se tornam destrutivas.
Não se deve extirpar o instinto, mas torná-lo conhecido. Sobre a ordem patriarcal, vemos nos contos de fadas que é necessário que seja substituída por uma nova ordem mais compatível com as necessidades atuais.
Nos contos, vemos o Rei que ou está doente ou velho e precisa ser substituído ou por um filho ou por um genro. No entanto, essa velha ordem sempre se interpõe à nova e tenta impedir sua ascensão.
Na Mitologia, vemos isso no mito de Cronos e Urano. Urano tenta impedir que um de seus filhos o substitua e assim não permite que saiam do ventre materno. Cronos, o caçula, o castra dentro do ventre da mãe. Zeus faz o mesmo com seu pai Cronos, que engole os filhos temendo ser destronado.
Zeus também repete esse feito dos ancestrais: ele engole sua esposa Metis (grávida de gêmeos – um deles Atena) com medo de uma profecia que previu que um descendente implantaria uma nova ordem. E assim impede a renovação.
Ainda vivemos sob o jugo de Zeus e o representante ainda não nasceu. Temos apenas Atena, um feminino que foi subjugado aos moldes, à ordem e às leis patriarcais. Mas talvez o nascimento de Atena traga futuramente a resposta a essa indagação. Talvez a renovação venha pela mulher. Mas isso é apenas especulação.
O Pai também representa o Rei, símbolo da saúde física e espiritual do povo. Nas tribos mais antigas, quando o rei ficava velho ou doente, era morto e substituído.
Essa imagem arquetípica pode ser vista na relação pai e filho. A oposição inconsciente à nova ordem vigente corresponde ao lado terrível do arquétipo Pai. O medo da superação pelo filho pode tomar o homem. Isso se aplica mais ao filho homem do que à filha, pois no imaginário do pai ela não é páreo para ele e leva a projeção de sua Anima.
Um pai pode impedir o desenvolvimento do filho, planejando sua vida a ponto dele não conseguir pensar em nada a não ser o que o pai planejou a ele.
Para mudar isso é necessário consciência e amor. Talvez por isso tantos homens hoje não se sintam amados por seus pais, gerando mágoa e perpetuando a neurose com seus próprios filhos. Eles podem encontrar outros “pais”, uma figura amorosa de um mentor, por exemplo.
O filho o lembra de uma juventude e jovialidade que não voltam mais e uma lei nova que pode suplantá-lo. No entanto, esse pai como função estruturante move o filho em direção ao seu desenvolvimento e ele pode incorporar e viver outro arquétipo: o do herói. Mas isso é uma outra história.
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