Quando os batuques de água começaram, todo mundo parou para ouvir. A estiagem, enfim, acabou.
A chuva chegou. O ar ficou melhor. As pessoas celebraram. Isso é, até as enchentes começarem. Ainda que seja mais fácil de aceitar do que seca, ninguém vai celebrar isso.
Cheiro de chuva sempre trás um toque de alegria. Alegria melancólica, porque a enchente pode chegar.
Ainda assim, chuva caindo é o tipo de coisa que nos leva a pensar. A pensar na raiva, a pensar no tempo, a pensar, até mesmo, na chuva.
O mundo anda tão cheio de raiva por coisas pequenas. Política, palavras, futebol. Aquecimento global e até a seca. As discussões nascem e crescem, virando competições para ver quem grita mais alto para anunciar suas certezas. Como se ser ouvido por mais gente tornasse alguma coisa mais verdade do que outra.
Verdades absolutas só existem para algum dia se chocarem com a de alguém. Até porque de certo, nessa vida, é só que ela acaba.
E a chuva cai, indiferente a nós. E as pequenezas da nossa existência.
Crianças brincam, cachorros buscam abrigo, a enxurrada leva folhas e sujeira embora. A água dá uma trégua, e por um segundo, o mundo parece melhor. Bom se estivesse mesmo. Bom se a enxurrada pudesse levar a raiva embora também.
Felizes são as plantas. Para elas, não existe tempo ruim se a água está caindo farta, como deveria ser. Triste é o asfalto, que fecha o chão e faz a água ser a protagonista dos desastres.
Mas ainda dá para celebrar a chuva. Celebrar até a alegria da celebração, de pessoas que ainda não acharam motivo para brigar. E num fim de tarde, quando á agua batuca de leve no telhado, dá até para encontrar um pouco de paz.
Por um rasguinho nas nuvens dá para ver um único raio de sol avermelhado, pouco antes dele se por. Parece até a esperança, pequenininha. Uma nesga de luz num céu cinzento. Mas a esperança está lá. De que, assim como a chuva chegou, a felicidade de um mundo melhor pode um dia chegar também.
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