Mulan é uma animação da Disney de 1998, baseada na lenda chinesa de Hua Mulan, descrita no famoso poema narrativo chinês “A Balada de Mulan”, que narra a história de uma heroína que, disfarçada de guerreiro, se une a um exército masculino.
Na animação a história se passa no ano 450 d.C. quando o exército dos hunos invade a China imperial, movido pela indignação em relação a construção da Grande Muralha.
O Imperador ordena que um homem de cada família seja convocado para servir ao exército e ajudar na expulsão dos invasores. A jovem Mulan, sabendo que seu pai, o ex-soldado Fa Zhou, que está velho e doente e, portanto, não resistiria à guerra, decide assumir o lugar dele, se disfarça de homem e se apresenta no exército com a armadura e a espada de seu pai.
Os ancestrais da família Fa sabem que se seu segredo for descoberto ela será condenada à morte por traição e, decidem mandar o Grande Dragão de Pedra para ajudar a trazê-la de volta com vida. Mas o dragãozinho Mushu, cuja única função no templo é fazer soar o gongo para acordar os outros ancestrais, quebra acidentalmente a estátua do tal dragão ao tentar fazê-la ganhar vida e, temendo a ira dos ancestrais, resolve, às escondidas, ajudar Mulan a voltar vitoriosa da guerra e assim conseguir se tornar guardião da família.
Logo de início vemos que a heroína se encontra em um conflito de identidade. Sua tradição familiar e social lhe ordena que se case e que seja uma boa esposa submissa. Porém a menina não possui a menor aptidão para tal papel. Ela é desastrada e não possui a vaidade das outras mulheres. Entretanto ela se esforça para agradar principalmente seu pai. Podemos afirmar que Mulan é uma garota com um forte complexo paterno negativo, onde o pai rebaixa sua tentativa de se firmar como indivíduo que não apoia seus conflitos.
Na época onde se passa o filme a mulher tinha um papel secundário. Elas nem podiam dirigir a palavra a um homem.
É comum em determinada idade, geralmente quando se encontra na pré-adolescência, o indivíduo questionar as crenças e os valores passados pelos pais e pela sociedade em que vive. Isso mostra que o adolescente está em busca de sua própria expressão, aquela que vem de sua alma. Isso é saudável, uma vez que a desidentificação com as figuras parentais cria um espaço para que a verdadeira individualidade possa desabrochar.
E para que a personalidade de Mulan pudesse se manifestar, paradoxalmente foi necessário que ela primeiramente vivesse como homem. Levando o seu complexo materno ao esgotamento. Ela assume então a personalidade do pai e vai lutar na guerra. E nessa empreitada Mulan é auxiliada por seus ancestrais.
Os ancestrais estão mortos, portanto fazem parte do inconsciente coletivo familiar de Mulan. É interessante notar que a ancestralidade quer se desenvolver. Eles auxiliam Mulan a ser vitoriosa. Isso significa que o inconsciente é dinâmico e busca por meio da manifestação da consciência humana o seu desenvolvimento. Quem não acompanha o desenvolvimento do inconsciente fica com o seu processo de individuação estagnado, gerando neuroses.
Mulan é auxiliada por um animal mágico, o dragãozinho estabanado Mushu. É muito comum em contos de fadas o herói ou heroína serem auxiliados por um animal mágico, que representa nosso instinto animal O animal do conto é um dragão. O dragão tem uma forte ligação com a China e acredita-se que esse é um ser mitológico criado lá.
Trata-se de uma fusão de serpente e pássaro. A serpente é um animal ctônico, ligada aos deuses do mundo subterrâneo. O pássaro é um animal ligado ao espírito, ao Logos e aos deuses que moram no Olimpo. Portanto é um animal ambivalente, que une masculino e feminino e o poder criador e destruidor.
Na China, que é o lugar onde se passa a história, o dragão representa a força e a glória do Imperador. Ele é considerado o protetor dos tesouros, tanto os provindos da terra (ouro e jóias), quanto os provindos do espírito (conhecimento e sabedoria).
Mulan tenta unir sua natureza feminina e masculina, em busca do equilíbrio em sua natureza, representado aqui pelo dragão.
Mushu ajuda Mulan na empreitada de salvar o Imperador, ou seja, a heroína, ao salvar uma autoridade reconhece e aceita sua verdadeira natureza. Ela encontra a sabedoria e seu tesouro interno, seus dons. Ela é reconhecida e valorizada publicamente.
Mulan pode ser considerada uma representante humana da deusa grega Atena. A deusa Atena é uma deusa da guerra. É uma verdadeira estrategista de guerra, vencendo até mesmo o poderoso Ares. Deusa da sabedoria, que unia em si princípios femininos, como a fertilidade do solo e masculinos como a sabedoria e o conhecimento estratégico.
Em nossa sociedade ocidental cristã, possuímos como mito principal o de Cristo como encarnação do Deus em terra, mas não possuímos ainda um mito que mostre uma representante, uma filha da Deusa. Entretanto, histórias como Mulan, nos mostra que o feminino quer se fazer presente novamente na consciência coletiva e que é extremamente importante resgatarmos esse aspecto de forma a alcançarmos o equilíbrio dessas duas forças.
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