Minha avó tem 94 anos. Passou por guerras, imigração, a criação de cinco filhos e a morte de dois. Passou pela morte do meu avô, muitas cirurgias e internações. Passou também por muitas alegrias, netos e bisnetos, viagens e diversão em família. Está cansada e doente e perguntou, no meio do banho que minha mãe estava dando nela: “Por que eu não consigo morrer?”.
A pergunta é um soco no estômago, e, acreditem, nunca ouvi ninguém perguntando isso. Mas, de fato, na prática bem racional, faz sentido. Ela mora em um corpo velho e doente. Sempre foi uma mulher ativa, fazia mil coisas num mesmo dia e agora passa os dias tricotando mais meias do que os pés da família toda poderiam usar. Sente-se mal, inútil, a cabeça não funciona bem e a maioria das pessoas não tem muita paciência com ela.
Como é difícil abrirmos mão das coisas. Um corpo, uma casa, um relacionamento. Esses dias me peguei olhando a pequena sala que montei como um apartamento em São Paulo, já que moro no litoral. Sem nada. Um sofá-cama, uma mesa de escritório e uma gambiarra de chuveiro. Olhei e chorei. Abri mão da minha vida em São Paulo, estou morando numa casa emprestada lá. Nada mais de varanda e piscina para mim. Mas fiz isso em favor de um propósito maior, ainda não alcançado. Estou em transição e ainda enlutada pelas perdas.
Faça o teste e descubra se o que você sente é amor ou apego
Mas perdas são necessárias. Não existe seguir na vida sem abrir mão de algo. O bom é inimigo do ótimo, e isso é verdade. Podemos ter o bom, o médio por muito anos, sem sermos verdadeiramente felizes. Nem infelizes. Podemos ser apenas alguém que passou pela vida, que tricota meias ou tem o básico. Ou podemos ter tudo.
O tudo é diferente para cada pessoa. Não é preciso ser milionário para ser feliz, mas é preciso sentir-se financeiramente seguro. Pesquisas indicam que, a partir de um certo ponto, o dinheiro não traz mais felicidade. Mas é preciso ter o que você prioriza e acha importante.
Relacionamentos precisam de tempo e prioridade. Trabalho precisa de tempo e prioridade. Saúde, idem. Mas às vezes precisamos renunciar a pessoas que não caminham conosco ou a um trabalho que parece bom, em favor dos nossos verdadeiros sonhos. E dói, vou avisando. Mas o apego, como está sentindo na pele a minha avó, dói mais. Pode ter certeza disso.
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