“Não cai uma folha sequer de uma árvore, se não for pela vontade de Deus”.
Era assim que minha mãe explicava as coisas que não tinham explicação e que aconteciam, porque aconteciam. E foi com essa frase que tentei explicar à senhora que estava à minha frente na fila de espera e mostrava-se desesperada com a garotinha que estava no parque, balançando-se cada vez com impulsos mais fortes para alcançar um voo mais alto.
Sei o que é isso porque, na minha infância, fiz muito disso. E acho que você também deve ter feito. Haja adrenalina! Mas o perigo e a sensação de vencê-lo são inebriantes.
A senhora começou a dizer-me que a garotinha não a obedecia e que ela era sua responsável e tutora, uma vez que a filha a havia adotado, na época com dois anos e que agora estava com oito e, após um ano falecera, pedindo, antes de morrer, para que ela cuidasse da menina. Não a deixasse, jamais, voltar para a creche de onde a retirara ou outra qualquer.
Mas tudo tinha o ranço da injustiça, uma vez que estava com setenta e sete anos e agora via-se presa à vida da menina. Era viúva e, o genro, não havia querido essa responsabilidade de “ser pai” e sumira por aí. Para ela, tudo não passava de injustiça de Deus. Ele não tinha o direito de fazer isso com ela.
Mas, ao mesmo tempo, contou que, logo que se deparou com a garotinha, pela primeira vez, ficou paralisada com seu olhar marcante. Era como se a conhecesse desde há muito tempo – algo inexplicável, que não a deixou dormir por noites seguidas.
A fila andou e fomos designadas para departamentos diferentes. Enquanto deu, fiquei observando a senhora atônita e a garotinha pulando e dançando à sua volta, fazendo-a rodopiar também sem querer dançar, com passos pesados e incoerentes.
Encontro marcado por Deus? Certamente, porque estavam juntas agora e, “pelo andar da carruagem”, muito ainda terão que caminhar juntas e se suportar nesse encontro de folhas caídas pelo chão.
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